Conselho Regional de Farmácia

De Mato Grosso do Sul

Artigo: A Anvisa e os nomes dos medicamentos

As regras para a adoção dos nomes comerciais dos medicamentos, previstas pelo item 3 da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 333, de 2003, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), estão para ser revistas e é imprescindível que isso seja feito o quanto antes, de modo que a autoridade sanitária passe a adotar critérios mais apropriados para a análise de colidência das marcas dos medicamentos por ela registrados. Desde a implementação da RDC nº 333, a Anvisa já modificou um dos critérios relativos a essa análise. O edital de notificação, de 27 de abril de 2005, trouxe um importante avanço com relação à questão. A partir de um levantamento das marcas dos medicamentos registrados junto à Anvisa consideradas semelhantes, a agência solicitou às empresas, por meio desse edital, a entrega de documentação referente à propriedade dos nomes comerciais dos medicamentos. Nesse aspecto, apesar de o item 3.1 da RDC nº 333, estabelecer que "o nome não pode ser assemelhado ou gerar confusão com outro nome de medicamento já registrado ou protocolado na Anvisa na forma impressa, manuscrita ou falada", a partir da publicação do citado edital, a Anvisa passou a adotar um critério, no mínimo, mais apropriado. De acordo com o edital, se existirem dois medicamentos registrados na Anvisa, cujas marcas sejam colidentes, prevalecerá aquela que tiver o registro mais antigo no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Um resultado preliminar da análise feita pela Anvisa a partir desse edital foi publicado em 17 de julho de 2006 e as empresas tiveram um prazo de dez dias, contados da publicação, para apresentar seus recursos. Entretanto, a decisão final sobre o assunto ainda não foi publicada e, muito provavelmente, esteja pendente devido ao critério de análise de colidência de marcas estabelecido pelo item 3.4 da citada RDC, que se mostra insuficiente para resolver esse tipo de conflito. Com efeito, de acordo com o item 3.4, "pode ser utilizado nome assemelhado a outro já registrado desde que se diferencie por no mínimo três letras distintas, presentes ou ausentes, limitando a probabilidade de haver confusão na escrita para resguardar a identidade do produto realmente prescrito". O problema é que esse critério serve apenas para evitar confusões relativas à caligrafia médica, mas não para evitar a associação de medicamentos e/ou de seus fabricantes. Por exemplo, de acordo com essa regra, mesmo estando a marca "Aspirina" registrada no INPI em nome da empresa Bayer, a Anvisa poderia permitir o registro de um produto sob a marca hipotética "Veloaspirina", em nome de um concorrente, pois esta possui quatro letras a mais e, portanto, não seria passível de confusão na escrita. Ocorre, entretanto, que, de acordo com o artigo 124, inciso XIX da Lei de Propriedade Industrial - a Lei nº 9.279, de 1996 -, a marca "Veloaspirina" jamais poderia ser concedida a um concorrente da Bayer, não apenas por isso ser prejudicial aos direitos adquiridos por ela sobre a marca "Aspirina", mas também porque a coexistência dessas marcas poderia induzir o consumidor a erro, confusão ou à associação dos produtos e de seus fabricantes. Como se pode observar, o critério das três letras pode evitar erro ou confusão na escrita, mas não é adequado para resolver todas as situações em que haja possibilidade de associação e/ou de confusão e, portanto, a análise de colidência da Anvisa não pode ficar restrita a ele. Nesse sentido, uma análise de colidência de marcas farmacêuticas deveria, minimamente, levar em conta: 1) a semelhança das marcas sob o aspecto fonético, testando as marcas de produtos solicitados tanto no balcão, como por telefone; 2) o tipo de produto a que elas se destinam, como, por exemplo, se é um produto de venda livre ou de prescrição e, neste caso, com ou sem retenção de receita; 3) a via de comercialização dos produtos, ou seja, se são vendidos diretamente ao consumidor ou apenas para hospitais e postos de saúde; e 4) a possibilidade de erro, confusão ou de associação para o consumidor com relação não só aos produtos em si, mas também à sua origem. Como se verifica, além do avanço trazido pelo edital, é preciso que a Anvisa reveja o item 3 da RDC nº 333 e estabeleça critérios adicionais para a análise de colidência de marcas, os quais possam não só avaliar o risco sanitário de forma adequada, como também serem condizentes com os preceitos do direito marcário. Só assim ela poderá resolver a questão dos conflitos apontados pelo resultado preliminar do edital, de maneira rápida e satisfatória. Deborah Portilho é advogada especializada em marcas, com foco na área farmacêutica, sócia do escritório DP&NS - Deborah Portilho & Nara Saraiva Advogadas Associadas, professora de direito marcário do LL.M. em direito corporativo do Ibmec do Rio de Janeiro e consultora do escritório Daniel Advogados.